A UFSCar e a Agricultura Familiar II
A experiência do Curso de agronomia com ênfase em Agroecologia e sistemas rurais sustentáveis – UFSCar Sorocaba/PRONERA/INCRA
Em novembro do último ano, se encerrou o ciclo de ensino que marcou um importante passo no sentido da democratização do conhecimento dentro da UFSCar. Foi neste mês que os graduandos do curso de Agronomia do PRONERA defenderam seus Trabalhos de Conclusão de Curso, concluindo as exigências do curso de Bacharel em Agronomia com Enfase em Agroecologia e Sistemas Rurais Sustentaveis: Vitória!
Após 7 anos de atividade, o curso formará 48 Agrônomos, assentados da reforma agrária de todo o estado de São Paulo, sendo que a colação de grau será no dia 17 de março de 2016, em Sorocaba. E, para homenagear todos os envolvidos no projeto, a Rede reservou este espaço especial e vai contar um pouco desta caminhada que juntou esforços de professores da UFSCar, representantes do INCRA e dos movimentos sociais do campo MST, FAF, FERAESP, OMAQUESP e dos estudantes.
A demanda de promover um curso de formação superior voltado às famílias de assentados da Reforma Agraria na região foi apresentada pelo INCRA e acolhida pelos parceiros no Seminário Universidade e Reforma Agrária no dia 30 de junho de 2006 (São Carlos). A partir daí, os envolvidos dedicaram sua atenção em trabalhar a ideia de criar um curso que fugisse do modelo tradicional de educação nos moldes da academia e respeitasse o perfil da realidade local dos camponeses e camponesas. Foi neste pensamento que nasceu conteúdo programático e se definiu a abordagem e a metodologia que nortearia as atividades. Imagine então o quão desafiador foi esta tarefa por parte dos coordenadores, docentes e monitores! Talvez tão desafiadora quanto essencial…
A Pedagogia da Alternância entrou como a metodologia que cumpria com este papel. Os estudos eram intercalados entre Tempos Escola – para estudos, leituras e pesquisas, além das atividades pedagógicas na Universidade, práticas e experimentações, dias de campo e viagens de estudo – e Tempos Comunidade – que estabelecem uma ponte direta entre os estudos e a situação concreta dos assentamentos de reforma agrária onde residem os estudantes. No decorrer das atividades, evitou-se recorrer à dinâmica “aulas teóricas e aulas práticas” por se entende que toda teoria está vinculada a práticas, e não há prática sem teoria.
Frente ao cenário problemático da agricultura que atinge não exclusivamente o Brasil, mas se tornou uma realidade mundial, a abordagem que enfatiza a agroecologia veio como uma solução alternativa. Foi de entendimento dos envolvidos que o modelo convencional de agricultura cartesiana e reducionista é o causador da crise social e ecológica que afeta o setor agrícola e que, visando uma mudança de paradigma no setor, o curso deveria ser visto através das lentes da agroecologia, onde a agricultura é feita no manejo de um sistema complexo das partes que o compõe e, portanto, cada uma destas partes devem ser entendidas e respeitadas.
Por Aline Roja Holmos, estudante do curso de Engenharia Florestal – UFSCar/Sorocaba
“Para mim, participar como coordenador deste curso foi uma experiência muito rica, gratificante e desafiadora. Agora, passado estes sete anos com tantos entraves e dificuldades superadas, vemos a evolução e o desenvolvimento que trouxe a todas as pessoas e entidades envolvidas, sendo estes educandos, educadores, universidades e movimentos sociais do campo. Um aspecto marcante é o potencial de possibilidades e portas que se abrem a partir do momento em que foi possível a participação destes atores sociais na universidade, enquanto um espaço de construção do conhecimento.
E isto principalmente no campo da Agroecologia, onde não só o aspecto do conhecimento cientifico, mas também a questão da prática e da política caminham juntos.
Um outro ponto importante que refletimos é o fato de que este tipo de projeto deve ser incluído urgentemente como uma política pública permanente do MEC dentro das universidades, pois da forma como foi executado, com recursos do Pronera, via INCRA/MDA, experienciamos diversos entraves e tensões, causados em grande parte por dificuldades em relação ao repasse dos recursos. Deve se tornar um curso regular dentro das universidades, voltado para assentados e agricultores familiares, baseado na pedagogia da alternância, mantendo os princípios da educação no campo e todo o acúmulo de experiências a partir do PRONERA. Desta forma, todos os aspectos positivos que vivenciamos neste projeto seriam potencializados e a maioria dos problemas que enfrentamos seriam minimizados. Deixando bem claro, uma proposta assim não deve excluir a continuidade do Pronera, enquanto uma política pública voltada para a reforma agrária pelo INCRA.
Por fim, a Agroecologia enquanto referencial teórico deve permanecer como princípio norteador deste tipo de curso, enquanto proposta concreta de mudança de paradigma para formação de técnicos.
Apenas por este caminho poderemos de fato avançar rumo a transição para uma agricultura mais sustentável em todos os aspectos, que traga melhor qualidade de vida para as populações camponesas e urbanas.”
Por Prof. Dr. Fernando Silveira Franco, docente do DCA/ UFSCar/ Sorocaba e Coordenador do Curso “Curso de agronomia com ênfase em Agroecologia e sistemas rurais sustentáveis” – PRONERA/INCRA
A UFSCar de Lagoa do Sino e o Sítio Agroecológico experimental – um espaço da Agricultura Familiar
O campus Lagoa do Sino da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), situado no município de Buri, instituiu-se a partir da doação da fazenda do escritor Raduan Nassar para o governo federal, objetivando a transformação da propriedade numa instituição de estudos e pesquisas, com a proposta de contribuir com o desenvolvimento econômico e social dos municípios no seu entorno.
A decisão de doar a fazenda Lagoa do Sino e trazer uma universidade pública para contribuir com o desenvolvimento econômico e social dos municípios da região teve seu início em 2009, quando o escritor primeiramente objetivou doar a área para a Universidade de São Paulo (USP). No entanto, a negociação não deu certo, pois o governo estadual tentou reduzir o espaço a uma unidade experimental.
Posteriormente, por influência de dois amigos jornalistas do escritor, a ideia da doação da fazenda para transformá-la em campus de uma universidade pública acabou chegando até o governo federal, que por meio da UFSCar enviou uma equipe multidisciplinar ao local para fazer um novo diagnóstico entre os anos de 2010 e 2011. Com a aprovação do estudo pelo Ministério da Educação, houve então a doação do espaço sob algumas exigências do escritor, a fim preservar uma parte da história da fazenda. Permanecem trabalhando no local, inclusive, os funcionários anteriores.
A inauguração do campus Lagoa do Sino ocorreu em 26 de junho de 2014, contemplando o quarto campus da UFSCar no Estado de São Paulo. Desde o início de 2014 são ofertados três cursos de graduação:
Engenharia Agronômica, com ênfase em Agricultura Familiar; Engenharia Ambiental, com foco em Sustentabilidade, e Engenharia de Alimentos, destacando a Segurança Alimentar.
A região onde o campus se insere apresenta como característica peculiar a predominância da agricultura familiar, presente em aproximadamente 70% das propriedades agrícolas existentes e impactando positivamente o PIB agrícola regional, um dos maiores do Estado de São Paulo. Em contrapartida, apesar da significativa produção, a região possui um dos piores IDHs paulistas, com baixos índices de acesso à educação, saúde, emprego, e outras políticas públicas.
Os cursos são em período integral, com duração de cinco anos e, diferentemente dos outros cursos nestas áreas existentes no país, o sistema de ensino é inovador por ser estruturado em eixos temáticos. Os eixos visam o fortalecimento, crescimento e desenvolvimento não apenas da região, mas do território como um todo. São quatro os eixos do campus Lagoa do Sino: Desenvolvimento do território, agricultura familiar, segurança alimentar e sustentabilidade. Norteadas por estes temas, todas as atividades são conjuntamente desenvolvidas pela equipe do campus, como foi o caso da elaboração de um projeto para a implantação de um sítio modelo, que comtemplará a produção sustentável aliada à agricultura familiar.
O projeto do sítio modelo, também nomeado como Sítio Agroecológico, vem sendo desenvolvido em uma área de 2,6 hectares da fazenda e visa à simulação da agricultura familiar sustentável a partir de cultivos agropecuários integrados (como o caso da integração do sistema agroflorestal com a pecuária),baseados em processos orgânicos de produção, sem o uso de agrotóxicos e de adubos químicos.
A existência do sítio é o primeiro passo no sentido de transformar, em longo prazo, a fazenda onde o campus está instalado em uma área produtiva calcada nos preceitos da sustentabilidade. Além de contemplar pesquisa, ensino e extensão, o sítio engloba esse projeto maior, de ajudar a construir um campus voltado para as ações sustentáveis e de agricultura familiar.
Atualmente os estudantes do curso de Engenharia Agronômica e os Técnicos em agropecuária deram início às atividades práticas na área do sítio. Além da capina, houve o plantio de mandioca, abóbora, milho e alguns adubos verdes no local (feijão, feijão de porco, feijão guandu).
Ademais, a existência do sítio agroecológico visa propiciar uma vivência para docentes, discentes, funcionários, extensionistas e agricultores familiares situados no território de localização do campus. Para os estudantes, além da área ser uma ferramenta de estágio aos discentes, garantirá o conhecimento e compreensão acerca da dinâmica da produção da Agricultura Familiar. E, para os extensionistas, este será um espaço fundamental de trocas com a Universidade.
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Por Eduardo Lopes Doracenzi, estudante do Curso de Agronomia – UFSCar/ Lagoa do Sino